03 fevereiro 2024

Carnaval de rua de Salvador

CARNAVAL DE RUA RAIZ É SALVADOR: 

O PRIMEIRO DO BRASIL E DA PORRA TODA. 💃🏼🕺💃🏼🕺💃🏼🕺💃🏼🕺💃🏼🕺💃🏼🕺

(Texto em baianês de Louti Bahia @amoahistoriadesalvador. Publicado em 31/01/2024)

Ó véio, não venha com seu mimimi dizeno que o primeiro carnaval do Brasil foi de lá casa da porra não, vu? O primeiro foi de Salvador, mô pai. Não aperte minha mente com sua história mal contada e meeira, não. Pare de tirar onda, deixe de reme-reme e dor de cotovelo: conte essa história direito.

Sabe quando foi o primeiro carnaval do Brasil? Em 1549. 

Sabe aonde? Em Salvador, nas aldeias indígenas.

E sabe quem fez? Os padres jesuítas que vieram com Tomé de Sousa.

Colé de mermo, veio? Que porra é essa? Padre fazeno carnaval? Isso é culhuda. 

Né não, pai. É a vera mesmo. Vá estudar história. O carnaval faz parte do calendário católico. Não parece, mas é. Juro de pé junto. Por isso, abestado, que ele sempre acontece 40 dias antes da Páscoa. E esses 40 dias se chama quaresma: não pode bagunçar, não pode comer, não pode beber, não pode fuuu..çar a vida alheia. Não pode porra nenhuma, só pode rezar. É a maior prezepada!  

Aí, pra aguentar 40 dias pianinho, tem que picar o dente antes. Né não, é? Por isso que tem o carnaval pra galera abrir o gás, soltar os cachorro e liberar geral. Tá ligado? O coro come e todo mundo dá o zig.

Já tá todo se bulino, aí, né? Então, se plante e preste atenção que a história não terminou. Vou le dar a real: papo reto não faz curva. O carnaval foi introduzido (lá ele) no Brasil pela própria igreja católica. Os jesuítas botoram pocano: usaram o carnaval pra catequizar os indígenas. Pegaram a cultura das zoropa e disseram assim: feche a cara e engula o choro. E paroano vai ter de novo!

E teve mesmo, desde o século XVI. Aí, quando chegou no século XIX, a festa já tava grandona. Mas ainda era careta, ninguém comia água não. Era no largo do teatro, onde hoje tem a Praça Castro Alves. Tinha o Theatro São João lá, a maior casa de ópera do Brasil. O carnaval arrudiava ele desde a Rua Chile que ainda nem era a Rua Chile. Dava uma paletada da porra, todo mundo de fantasia e máscara. Era cagado e cuspido o carnaval de Veneza. E todo mundo querendo se batê com o outro pra saber quem era: 

- Ô coisinho, você é quem? 

- Não te interessa!

- Cheeeeupo!

E aí, uma picava bola feita de limão e laranja no outro. Mas era cheia de perfume. O nome dessa brincadeira bizarra era Entrudo, e também veio das zoropa: de Portugal e da Espanha. Mas esse era o camarote. Lá na cidade baixa rolava a pipoca.

Lá a modalidade era outra: não guenta vara, peça cacetinho. A galera não comia reggae: fazia bolas com tripas de porco e jogava era água suja, farinha, tomate e tudo mais. E não tinha máscara não: era na cara dura mesmo. E a cara nem ardia. Um armengue da porra!

E sabe quem recebeu a galinha pulando no carnaval de 1832? Charles Darwin. O cara inglês, saiu da casa da porra pra cá, chegou todo arrumadinho e tomou um banho de água suja no meio da muvuca. Foi barril dobrado. Ele arregalou os olhos e pensou logo: esculhambação da porra! Vou vazar daqui. Mas acabou ficano e gostou da cidade. Só que, anos depois, quando disseram pra ele voltar, ele disse logo: quem vai é o coelho.

Espia só. Já tinha essa história toda, mas só em 1884 o governo adiantou o lado e oficializou o carnaval. Eles acabaram com o mangue e colocaram ordem na bagunça. Proibiram o entrudo e organizaram desfiles de agremiações carnavalescas com carros alegóricos. Surgiram, por exemplo, o Cruz Vermelha e o Fantoches. E o governo disse: se plante, vú. Agora tem que ter enredo, fantasia, música instrumental e coisa e tal. Aí começaram a usar as marchinhas do Rio de Janeiro e os frevos de Olinda. A festa ficou cabeça de gelo. As famílias ricas acharam difudê e começaram a desfilar com carrões enfeitados. 

10 anos depois, o governo liberou o desfile dos negros e teve o primeiro afoxé passando pela Rua Chile. Pire aí? Você pensando que afoxé surgiu nestante ali na esquina. E no ano seguinte, só tinha esse afoxé na rua? Aoooonde! Tinha era 14. Ninguém ficô dendecasa: todo mundo na rua. Vumbora! Era cânticos em nagô, batuques de terreiro, samba, Candomblé... mas deu merda. A imprensa escaldou o pico e chamou a galera de “os infames do candomblé de rua”. Não deu outra. Racismo, pressão da elite e o governo disse: vaze daqui. Em 1905, um decreto fulêro proibiu o desfile de afoxés e também tirou a capoeira, o candomblé e as batucadas das ruas de Salvador. Aí o povo negro disse assim: é niuma, cá te espero. E foi fazer a festa na butuca, longe da fiscalização. Destá que um dia a gente volta pocano. 

Aí, na Rua Chile, continuou o carnaval cara pálida, cheio de Parmalat. O povo nem ficava com a roupa machucada. E o tempo passou avionado com esse carnaval maresia.

Até que, em 1949, surgiu os Filhos de Gandhy formado por estivadores do Porto. Foi boca de zero nove! E em 1951, o clube de frevo Vassourinhas veio de Recife desfilar em Salvador. Aí um tal de Dodô e um tal de Osmar olhou assim e disse: ó paí, ó! Que massa. Perainda que a gente vai adiantar o nosso lado também. Os caras pegaram um Ford T, trabalharam várias horas de relógio, entupiram de amplificador e ligaram na bateria. Ficou de lenhar! E os dois partiram a mil tocano na rua. O povo se amarrô e empurrô o carro quando acabô o combustível. A invenção brocô e no ano seguinte eles convidaram mais um tocador: Temístocles Aragão. Aí o nome foi daqui pra li: três músicos num carro cheio de eletricidade só pode ser um Trio Elétrico. E foram pra rua de novo. E o povo dijunto: é pra lá que eu vou!! Tinha pobre e tinha barão: todo mundo foi dar uma espiadinha. Aí Dodô e Osmar anunciaram: de hoje a oito a gente vai mostrá o pau elétrico pra vocês. E todo mundo respondeu: lá ele! Mas não era osadia não, era a guitarra baiana. E eles deram pra Armandinho que comeu com farinha e ficou miseravão. De lá pra cá, mermão, o povo fica atrás do trio e só sai no lixo. 

O resto da história você já tá ligado. Na década de 70 Moares Moreira pegou o microfone, escancarou e disse: eu vou cantar nessa porra! E foi o primeiro cantor de trio elétrico mesmo. E ficou virado no cão: botô letra numa música instrumental que chamou de Pombo Correio e fez sucesso nacional. Assim nasceu o frevo trieletrizado. 

Aí Caetano Veloso comeu a pilha e começou a fazer música para o carnaval também. Êta lasqueira! Misericórdia! Tava desenhado o destino do maior carnaval de rua do Brasil. 

Na década de 80 foi pressão pura! Tudo certo na Bahia: foi a vez dos blocos de índios e começou a geração Axé Music com Luiz Caldas, Sarajane, Daniela Mercury, Banda Mel e uma galera da porra. E pipocou também blocos afros: Olodum, Ilê Aiyê, Muzemza, Malê Debalê. E tome gente na rua, todo mundo apanhando de fanta, tomano baculejo, mas cantando “não me pegue, não me toque”.  

Ai aconteceu uma coisa porreta. O que tinha sido proibido pelo governo nas ruas voltou de com força e virou a cara autêntica do carnaval de Salvador. A herança africana ressurgiu injuriada e tomou conta da porra toda. Aí, escreveu não leu, o pau comeu: rolou fricote, deboche, sambareggae, axé, merengue, lambada, pagode e pagodão. A percussão sacudiu a poeira, se picô da cozinha e foi pra sala de visita.

E né quereno me gabá não, mas o carnaval de salvador virou a festona que virou, misturando som de branco, de negro e de índio com amplificador pro mundo inteiro ouvir. E veio gente de tudo que é lado: uzamigo da gente, uzamigo dos outros e os gringos.

Tá veno aê? Você pula carnaval, mete dança, vira pipoca, beija Deus e o mundo, só faltava conhecer a verdadeira história do primeiro carnaval do Brasil. Agora que já conhece, que mal le pergunte: tá aí ainda por quê, pomba lerda? Se pique logo pra mandar essa história pra todo mundo no whatsapp e na rede social. Eu te entreguei ela de mão beijada, largue o doce também. Namoral. Se você ficar com preguiça de espalhar esse texto, vou me retá. Tá rebocado.

(Texto de Louti Bahia @amoahistoriadesalvador. Publicado em 31/01/2024. Fonte das informações: História do Carnaval da Bahia, de Nelson Cadena)